quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Carta dos Direitos Humanos chega aos 60 anos como marco


Hoje, 10 de dezembro de 2008, a Folha de São Paulo traz a matéria abaixo, de autoria de 
Marcelo Ninio, de Genebra, sobre os 60 anos da Declaração de Direitos Humanos da ONU.


A Declaração Universal dos Direitos Humanos, talvez o documento internacional mais conhecido da história, completa hoje 60 anos de sua adoção como referência obrigatória no respeito às liberdades e direitos fundamentais do homem. 

Mesmo entre os ativistas que se dedicam a denunciar a limitada aplicação prática de seus 30 artigos, o texto é considerado a pedra fundamental do reconhecimento da igualdade e dignidade humanas, um marco que influenciou todos os tratados e iniciativas sobre o tema nas últimas seis décadas. 

Inspirada na Declaração francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, e na Declaração de Independência dos EUA, de 1776, a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi criada sob o efeito do trauma provocado pelos horrores da Segunda Guerra Mundial e do genocídio nazista. 

Seu primeiro artigo é certamente um dos mais repetidos em todos os tempos: "Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade". Os demais 29 defendem direitos básicos, como alimentação, segurança, trabalho e liberdade de expressão. 

Artigos muitas vezes em falta no planeta, reconhece a alta comissária de Direitos Humanos da ONU, Navanethem Pillay, para quem a declaração continua sendo uma "promessa não cumprida". Mas ela lembra que o documento inspirou vários tratados internacionais e as leis de mais de 90 países. 

Além disso, diz Pillay, a declaração motivou a criação de mecanismos regionais e nacionais de monitoramento do respeito a seus princípios, incluindo o Alto Comissariado, que chefia desde setembro. 

Para ela, a obsessão por segurança em alguns países nos últimos anos criou um novo desafio à declaração. "É preciso reconhecer que a impunidade, os conflitos armados e os regimes autoritários não foram derrotados, e que, lamentavelmente, os direitos humanos são às vezes colocados de lado em nome da segurança", disse a sul-africana Pillay à Folha, por email. 

"Incontornável"

Adotado em Paris no dia 10 de dezembro de 1948 pelos então 58 Estados-membros da ONU, entre eles o Brasil, o documento tornou-se a base de tudo o que foi pensado em direitos humanos desde então. 

"A Declaração Universal é um texto incontornável, que inspirou sete tratados e a própria estrutura da Comissão de Direitos Humanos da ONU", disse à Folha, de Pequim, o cientista político Paulo Sérgio Pinheiro, um dos brasileiros mais respeitados na área. 

Pinheiro, que foi relator da ONU em países onde o respeito aos princípios da declaração são pouco mais que uma utopia, como Mianmar, destaca a relevância histórica do texto. 

"Ele lembra que o século 20 não foi só os horrores de genocídio e limpeza étnica, mas também o início da caminhada para combater essas e outras atrocidades", diz. 

A embaixadora do Brasil para direitos humanos em Genebra, Maria Nazareth Farani Azevedo, defende a declaração como instrumento de cooperação, não de pressão. "Direitos humanos devem servir como inspiração, não imposição." 

A aplicação do documento é tema de constantes debates. Os ativistas que acompanham o Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, costumam deixar as sessões com uma sensação de impotência, pela falta de mecanismos de punição aos violadores. 

"Ninguém nega a importância da declaração, nem os países que não a respeitam", diz Julie Rivero, da Human Rights Watch. "O problema é que a politização dos debates leva os países a esquecerem que o mais importante é a defesa das vítimas, não de seus interesses." 
(Folha de SP, 10/12) 

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